sábado, 23 de junho de 2012

A INDEPENDÊNCIA DOS TRIBUNAIS




Dia desses, recebi um texto como sendo de autoria do Prof. Marco Antonio Villa, publicado na Folha de São Paulo. Impressionou-me sua crítica à forma com que o Senado sabatina o candidato a Ministro, que peço licença para copiar e aqui colar, com grifos nossos:

"O STF tem muitos outros problemas. Um deles é a escolha dos ministros, uma prerrogativa constitucional do presidente da República.
Cabe ao Senado aprová-la. As sabatinas exemplificam muito bem o descaso com a nomeação. Todos são aprovados sem que se conheça o que pensam. São elogiados de tal forma pelos senadores que fica a impressão que estão, com antecedência, desejando obter a simpatia dos futuros ministros frente a um eventual processo. Em síntese: as sabatinas são uma farsa e desmoralizam tanto o Senado como o STF."

Peço licença para fazer um pequeno reparo, porque o presidente não tem a prerrogativa constitucional de escolher o Ministro. Abaixo transcrevo o art. 101, da Constituição, para melhor entender o processo de nomeação dos Ministros.

Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.
Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.

O dispositivo diz que os Ministros do STF serão nomeados pelo Presidente, após a aprovação da escolha pelo Senado. Mas quem teria feito a escolha? O dispositivo não diz que a escolha tivesse de ser feita pelo Presidente.

De fato, a competência para nomear o Ministro é exclusiva do Presidente, mas somente após a sua aprovação pelo Senado. Isto está disposto no art. 84, da Constituição, com muito acerto, a nosso ver, pois é o Executivo que detém as informações acerca da reputação do futuro Ministro (existência de processos, impostos etc) e não poderia nomear um improbo, embora considerado como de notável saber jurídico.

Assim, ouso afirmar que existe uma lacuna na Constituição, quanto ao Órgão que teria competência para escolher o candidato, este que teria de ser arguido pelo Senado e nomeado pelo Presidente. Essa lacuna não existe para a escolha dos Ministros e Juízes dos demais Tribunais (STJ, TST, TRF etc), conforme está previsto nos arts. 104 e 107, para a Justiça Federal, no art. 111, para a Justiça do Trabalho etc, embora a forma de escolha deles também seja criticável.

No entanto, costumeiramente, vem prevalecendo a interpretação de que o Presidente
tem a competência para escolher o candidato, submetê-lo à apreciação do Senado e, se aprovado, nomeá-lo Ministro do Supremo Tribunal. Esse entendimento tem dado margens a críticas e com muita razão.

No diapasão desse costume, como exigir do Judiciário uma atividade imparcial? A impressão do autor do texto está correta, pois parece claro que, quando tomam posse, os Ministros já estarão comprometidos, no mínimo, com os agentes políticos (Presidente e Senadores) que os elegeram, e, por vezes, nem sempre pelo seu notável saber jurídico.

De fato, na expectativa de obter favores de um Ministro, um político sempre poderá lembrar-lhe o discurso ou o ato de apoio à sua nomeação. Essas coisas são odiosas, mas inevitáveis, pois fazem parte da interação humana. Recentemente, isso foi exemplificado em episódios escandalosos, envolvendo políticos e ministros.

Claro, então, que aquele costume é inconstitucional, pois vai de encontro à  afirmada independência entre os três Poderes da União, conforme disposição  imutável (cláusula pétrea) no art. 2º, da Constituição, que dispõe:

Art. 2º - São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário

Essa preocupação dos cidadãos (manifestada nos textos que circulam na Web) com a aparente inexistência de independência do Supremo, fica ainda mais acentuada, quando se verifica, na Constituição, que é o Supremo quem julga as ações penais comuns contra os membros do Congresso, e é o Senado que processa e julga os membros do Supremo nos crimes de responsabilidade.


Em curta digressão, registro que, salvo engano, não há previsão, na Constituição, da competência para julgar os crimes de responsabilidade dos parlamentares. O Supremo processa e julga apenas os crimes comuns dos parlamentares. Parece que se trata de outra lacuna na Constituição. Defende-se a previsão constitucional de um Conselho Popular, com competência para processá-los  e julgá-los, garantida a ampla defesa. 


Daí que a intimidade entre os seus membros jamais poderia ser bem vista pela sociedade, principalmente pelo grupo que tem a Ética como inseparável da Justiça.

Mas, pelo menos quanto ao art. 101, da CRFB,  a sua lacuna propicia a interpretação de que a harmonia entre os três poderes, prevista para a consecução dos fins constitucionais, possa ser confundida com a intimidade, em detrimento da independencia.

Portanto, defendemos que seja alterada o parágrafo único do art. 101, da Constituição, para que a escolha dos Ministros do Supremo passe a ser feita pelo voto dos operadores do Direito, cuja forma poderia ser estendida, também, à escolha da composição dos Tribunais Superiores e dos Tribunais Regionais (Federais e Estaduais).

Os operadores são os advogados públicos e privados, os procuradores do  Ministério Público, os defensores públicos, juízes etc, profissionais que em sua militância diária seriam os mais capacitados a escolher este ou aquele que tenha demonstrado um notável saber jurídico.

É evidente que a forma de implementação dessas eleições teria de ser discutida, entendendo-se que, em princípio, poderiam ser realizadas por cada  órgão ou associação das respectivas classes (OAB, Procuradorias,  Associações etc).

Os nomes dos mais votados seriam, então, enviados ao Conselho Nacional de Justiça, que é composto por juízes, advogados, procuradores da república etc, ao qual incumbiria a classificação e a comunicação do nome do primeiro colocado à Presidência.

Ao Presidente caberia apreciar a probidade do escolhido e, nada opondo, procederia à sua imediata nomeação. Se verificada a improbidade, o CNJ enviaria o nome do segundo colocado, e assim por diante. Mas nunca deixando para o Presidente escolher e nem atribuindo ao Senado qualquer apreciação.

Fauzi Salmem

JUSTIÇA = DIREITO + ÉTICA

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